Como funciona o EMDR?

Como funciona o EMDR?

A focalização de elementos da memória traumática e a estimulação bilateral (visual, auditiva ou tátil) promovem o “diálogo” entre os hemisférios cerebrais e a “metabolização” (reprocessamento) do trauma. Em pouco tempo, a pessoa começa a ter a sensação de maior distanciamento da perturbação traumática. Espontaneamente começa a reavaliar a experiência a partir de uma perspectiva mais otimista.

O EMDR “não é apenas movimentos oculares”, exige um profissional clínico devidamente capacitado e certificado pelo Institute de EMDR dos Estados Unidos para sua implementação. O EMDR é um tratamento que exige que se tome a história clínica do paciente, uma avaliação apropriada, o desenvolvimento de uma relação-terapeuta/cliente empática e a preparação do paciente para o EMDR em si. Os movimentos são feitos em conjunto com a psicoterapia para ajudar o cliente a integrar os traumas “metabolizados”.

A teoria mais proeminente para explicar o êxito do EMDR tem a ver com os movimentos oculares durante o sono REM (Rapid Eye Movement Sleep – Movimentos Rápidos Oculares). Parece que todos estamos processando as experiências do dia durante as etapas do sono REM. Em situações normais, parece que o cérebro “revisa” as experiências do dia, processa e arquiva as lembranças no seu enorme banco de dados cerebrais. No entanto, quando temos alguma experiência traumática, parece que o cérebro não consegue processar o evento e o incidente fica no nosso cérebro como um tipo de “nó neurológico”. É possível que os pesadelos sejam tentativas fracassadas do cérebro de processar as lembranças traumáticas.

Quando se pede para o cliente que se lembre de algum evento, situação, sensação traumática, e lhe ajudamos a mexer os olhos de determinada maneira, parece que o cérebro recebe a ajuda necessária para poder processar o fato e arquivá-lo. Perde-se a carga negativa associada ao evento, e muitas vezes se recupera as lembranças positivas vinculadas a isso, que antes não se podia perceber. Muitas pessoas têm a sensação de que a lembrança agora realmente está no passado, e que já não incomoda quando se lembram dela. Uma cliente em relação ao processamento de uma experiência de abuso sexual: “Dói, mas já não fere.”

Há pouco tempo, a Dra. Shapiro disse que foi um erro ter posto o nome de Dessensibilização e Reprocessamento através de Movimentos Oculares à técnica já que se descobriu outras formas de estimulação bilateral que funcionam bem, tais como a estimulação auditiva ou táctil. Para alguns clientes, essas formas dão melhor resultado porque nem todos conseguem mexer os olhos de uma forma apropriada enquanto estão pensando na lembrança dolorosa.

Sistema de Processamento Adaptativo de Informação

Essa teoria foi desenvolvida pela Dra. Shapiro para explicar os efeitos rápidos e adaptativos do tratamento que ela observou com os clientes. Parece que quando uma pessoa tem uma experiência traumática, do tipo “t” pequeno (“a professora me humilhou diante dos meus colegas e nunca mais pude falar em público”) ou “T” grande (cenas de morte, guerras, acidentes de carro, violência urbana, etc.) essa lembrança fica presa na sua própria rede neurológica exatamente como aconteceu – as imagens, o gosto, o cheiro, sons e as crenças – como si estivessem congelados no tempo dentro do corpo e da mente.

O cérebro tem um sistema de processamento de informação que mantém o nosso equilíbrio, mas quando há um trauma, o sistema se trava e pode causar uma série de sintomas típicos do estresse pós-traumático. (Parnell, 1997:54, 55).

Para começar o processamento, o terapeuta pede para o cliente trazer à sessão alguma lembrança ou pesadelo, uma imagem real ou imaginária, uma sensação corporal ou um pensamento. Quando se aplicam os movimentos oculares de EMDR (ou outra estimulação bilateral), se estimula a rede onde ficou presa a lembrança. Dessa maneira, se dá um “arranque” necessário ao mecanismo que restaura a capacidade de processamento do sistema. Isso permite a busca de informação em outras redes neurológicas onde o cliente pode encontrar o que precisa para compreender o que lhe passou. As duas redes – aonde está arquivado o trauma e aonde estão as informações úteis à compreensão – trabalham juntas num tipo de associação livre que se chama “processamento acelerado de informação.”

Cada série de movimentos continua soltando a informação perturbadora e acelera essa informação através de um caminho adaptativo até que os pensamentos, sentimentos, imagens e emoções tenham se dissipado e são espontaneamente substituídos por uma atitude positiva (Parnell, L. (1997) Transforming Trauma: EMDR. New York. p. 55)

O modelo de Processamento Adaptativo de Informação é a base teórica da abordagem do EMDR.

Baseia-se nas seguintes hipóteses:

  1. Dentro de cada pessoa existe um sistema fisiológico de processamento da informação por meio do qual as experiências e informações novas são processadas para alcançar um estado mais adaptativo.
  2. A informação é armazenada em redes de memória que podem conter pensamentos, imagens, registros auditivos, olfativos e de sensações corporais, todos relacionados entre si.
  3. As redes de memória organizam-se de acordo com sua relação com o evento mais antigo.
  4. Se, durante períodos de desenvolvimento cruciais do indivíduo, as experiências traumáticas e as necessidades interpessoais são continuamente negligenciadas, podem produzir bloqueios na capacidade adaptativa do sistema de informação. Esses bloqueios poderão impedir a resolução de eventos traumáticos ou perturbadores.
  5. Quando a informação armazenada nas redes de memória relativas a uma experiência traumática ou perturbadora não é completamente processada, torna-se possível o surgimento de reações disfuncionais.
  6. O processamento para estados adaptativos resulta em aprendizagem, alívio da perturbação emocional e somática, e em possibilidade de obter respostas adaptativas e integradas.
  7. O processamento da informação é facilitado por tipos específicos de estimulação sensorial bilateral. Baseada em dados obtidos pela experiência e observação, Shapiro refere-se a ela como estimulação bilateral (Shapiro, 1995) e estimulação de atenção dual (Shapiro, 2001).
  8. Alternando-se a estimulação visual, auditiva e tátil da esquerda à direita, em combinação com outros passos específicos do procedimento do EMDR, é incrementado o processamento da informação.
  9. Em geral, as estratégias voltadas para estimular suficientemente o acesso à informação que foi disfuncionalmente armazenada (e em alguns casos, à informação adaptativa), geralmente precisam ser combinadas com estimulação bilateral para produzir o processamento adaptativo da informação.
  10. Os procedimentos do EMDR fomentam um estado de equilíbrio ou de atenção dual entre a informação internamente acessada e a estimulação bilateral externa. Nesse estado, o paciente experimenta, simultaneamente, a lembrança perturbadora e o contexto presente.
  11. A combinação dos procedimentos do EMDR com a estimulação bilateral resulta em uma diminuição da intensidade das imagens da lembrança perturbadora e da emoção a ela relacionada, facilitando o acesso a uma informação mais adaptativa e possibilitando novas associações dentro das redes de memória, bem como entre elas.

O EMDR usa procedimentos psicoterapêuticos específicos para:

  • acessar informação existente;
  • apresentar informação nova;
  • facilitar o processamento da informação; e
  • inibir o acesso de informação (Lipke, 1999).

Referências:

Lipke, H. (1999). EMDR and psychotherapy integration: theoretical and clinical suggestions with focus on traumátic stress. Boca Raton: CRC Press.

Maxfield, L., e Hyer, L. (2002). The relationship between efficacy and methodology in the treatment of PTSD with EMDR. Journal of Clinical Psychology.

Shapiro, F. (1995). Eye Movement Desensitization and Reprocessing, Basic Principles, Protocols and Procedures. (1st ed.) New York: The Guilford Press.

Shapiro, F. (2001). Eye Movement Desensitization and Reprocessing, Basic Principles, Protocols and Procedures. (2nd ed.) New York: The Guilford Press.

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